Entrevistas

As brilhantes sugestões da Chef Viviane Cursino

Viviane Cursino
Quer inovar nas refeições da sua família? Confira algumas das inspirações da Chef sãotomense que está a fazer uma belíssima carreira em Portugal, e descubra quem é Viviane Cursino.

Viviane Dias Cursino (29 anos), nasceu no Rio de Janeiro (Brasil). Aos dois anos foi viver para Angola com a mãe. Mas aos seis passou a viver com os tios em São Tomé e Príncipe, onde fez o ensino básico e posteriormente o secundário em Guadalupe.

No ano 2000 imigrou para Lisboa  em busca de novas oportunidades e um futuro melhor. Em 2010 ingressou na Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril, no curso de Produção Alimentar em Restauração. Dois anos depois, integrou o projeto de reabertura do Pirata Lounge Beach em São Tomé.

Em 2014 concluiu a faculdade e começa a trabalhar na área profissional de restauração,  com passagens pelo Hotel Sana Lisboa,  Restaurante asiático Umai, restaurante Assinatura e Hotel Ritz em Lisboa.

Durante este percurso fazia caterings personalizados para pequenos grupos e eventos, apresentando grande aptidão para a pastelaria. Fez uma pequena formação de cabe design, aperfeiçoando algumas técnicas que já dominava e até então trabalho com isso.

No ano de 2016 representou São  Tomé e Príncipe no Festival da Lusofonia em Macau (China) com os seus super dotes culinários. Mas foi em Março deste ano que aceitou um grande desafio: liderar  uma cozinha no centro de Lisboa, baixa Chiado, no Hotel My Story Ouro.

Três meses depois, passou a liderar duas cozinhas, visto que também aceitou a da Taberna  do Lis igualmente na Baixa Chiado. Neste momento, está à frente da cozinha de um novo hotel na Av. Almirante Reis em Lisboa, que abriu em Outubro deste ano, projeto do qual faz parte desde a sua abertura.

STP Digital – Como iniciou a sua relação com a cozinha até se tornar Chef?

Chef Viviane Cursino – O meu primeiro contacto com a cozinha foi aos 4 anos de idade em Angola, quando fazia companhia a minha mãe e a “ ajudava” nas suas encomendas de bolos e salgados. Prestava muita atenção em tudo o que ela fazia e copiava. Fiz o meu primeiro calulú aos 5 anos! Roubava as sobras dos ingredientes e seguia passo a passo. Comia-se! (risadas)

Assim que fui para a Roça em São Tomé, a convivência com a minha avó e a minha tia deu-me a possibilidade de aprender os segredos da nossa gastronomia. Desde cedo, já confeccionava alguns pratos simples para a família. Nos primeiros tempos sempre com a supervisão da minha tia. Quando cheguei em Lisboa, descobri um mundo totalmente diferente ao que estava habituada, com uma diversidade e diferenciação de produtos e técnicas. Fui aperfeiçoando e adaptando aos os meus conhecimentos.

Viviane Cursino

STP Digital – Qual a diferença entre ser cozinheiro e ser Chef de cozinha?

Chef Viviane Cursino – Cozinheiro, é aquele indivíduo com conhecimentos culinários e  tem um papel direto na cozinha, confecciona os pratos. Este são classificados da seguinte forma: cozinheiro de primeira, segunda ou terceira. São identificados  consoante o conhecimento teórico/prático  na área e/ ou anos de experiência.

Chef é o profissional com uma vasta experiência na área da gastronomia. É aquele que assume o papel  de liderança e  comanda uma brigada numa cozinha, transmitindo assim,  a sua identidade como profissional, a sua criatividade na execução das  receitas, coordena e coloca  a sua alma nos pratos. Este passa por várias etapas até chegar a este patamar e não é logo que saia da faculdade ou termine o curso.

STP Digital – Qual a diferença entre gastronomia e culinária?

Chef Viviane Cursino – Gastronomia é a arte do conhecimento teórico existente em torno da culinária com o objetivo de potencializar o prazer de apreciar uma comida e tudo que a engloba, ou seja,  as  técnicas, práticas e conhecimento que ajudam a representar os toques de pura arte, mostrando a identidade e a alma de um prato com qualidade.

Culinária, é a arte de cozinhar, elaborar um prato que envolve também aspetos culturais como religião e política  de um povo.  Esta identifica não só os alimentos , mas  também as técnicas utilizadas, os utensílios, os métodos  que constituem a identidade cultural particular.

STP Digital – O que acha do fenómeno da “gourmetização”?

Chef Viviane Cursino – Gourmetização é basicamente pegar num produto, usar a criatividade e reinventar face ao original, utilizando  assim novas técnicas, produtos seleccionados, mais caros e exclusivos, dando uma  nova apresentação, personalizado à medida. Incentiva a criatividade e inovação do profissional em busca constante de novos conhecimentos, avanços tecnológicos, que está em mudança constante. Por outro lado,  com  a popularização do conceito são utilizados artifícios para encarecer alguns produtos ditos “gourmet” e exclusivos de forma a vender um produto, algo que não é muito bem visto. Mas as pessoas aderem. Sentem-se especiais.

Viviane Cursino

STP Digital – Tradicionalmente, em São Tomé e Príncipe, as mulheres são as responsáveis pela cozinha no quotidiano. Apesar disso, grande parte dos chefs de cozinha na hotelaria e restauração de referência no país são homens. Por que razão acha que isso acontece?

Chef Viviane Cursino – Penso que seja o caso de escolhas profissionais por parte de cada um. Os homens acabam por ter mais resistência a nível físico e emocional. É um trabalho muito pesado que exige muito esforço físico, muita dedicação e disponibilidade de tempo. Digo por mim. Nós perdemos o brilho, a vaidade, a disposição  depois de horas e horas de trabalho. Surgem-nos muitas manchas de queimaduras, cortes. As unhas devem estar cortadas, sem verniz e nada de make up. É um desperdício de dinheiro ir ao salão! Fora o stress diário na altura do serviço. A mulher tem o trabalho a dobrar, porque chega  em casa e tem uma casa, marido e filhos para cuidar, já o homem tem a vida mais  “facilitada”.

Da minha turma na faculdade, de 20 mulheres, apenas 3 ou 4 continuam na área e de 20 homens cerca de 15/18 estão na área, bastante singrados e competentes.

STP Digital – Existe diferença entre o homem e a mulher na cozinha?

Chef Viviane Cursino – A sociedade é  machista , não muda nada dentro de uma cozinha.  Há diferenças sim! Cabe a mulher executar o seu trabalho com profissionalismo, com muita eficácia e eficiência, e provar que vale o lugar que ocupa, provar que consegue  e merece estar ali, mas somos muito discriminadas. É duro!

STP Digital – Como vê o cenário da gastronomia em São Tomé e Príncipe?

Chef Viviane Cursino – Estamos ainda muito virados para a nossa cultura gastronómica, as raízes muito profundas e os paladares muito enraizados. O santomense arrisca muito pouco em novos sabores e paladares,  a maior parte das vezes buscam sempre o conhecido. Por outro lado, já existem muitos profissionais, que arriscam em inovar, pegam em receitas típicas e recriam utilizando novas técnicas, apresentação e brincam com produtos típicos e o mais importante nunca esquecendo da autenticidade dos pratos, do sabor base. São passos de inovação  que estamos a dar que acho fundamental para o desenvolvimento gastronómico santomense.

Viviane Cursino

STP Digital – Já começam a surgir alguns food trucks em São Tomé e Príncipe. O que acha desta moda?

Chef Viviane Cursino – Acho ótimo, sou super fã e apreciadora. Uma alternativa prática, humilde, rápida, simples  e barata  que serve como veículo de interação e convívio entre as pessoas. Algo que existe em quase todo mundo, foi  uma iniciativa muito positiva.

STP Digital – Já pensou em montar um restaurante em São Tomé e Príncipe?

Chef Viviane Cursino – Já, muitas vezes. Digo sempre que será o meu projeto para a velhice… São Tomé é a minha casa, e pretendo regressar um dia e abrir um projeto que tenho em mente há anos…

STP Digital – Quais são as suas especialidades?

Chef Viviane Cursino – sinceramente eu ainda estou por descobrir, até porque antes disso ainda tenho que decidir entre a cozinha e a pastelaria, para  depois decidir  a minha especialidade dentro delas. Sinto que  me adequaria a qualquer uma. Bem, neste momento, pelas influências passadas e pela minha formação profissional, diria que a cozinha portuguesa/santomense, mas com algum conhecimento em cozinha angolana,cabo-verdiana, brasileira e algumas europeias e asiáticas.

Viviane Cursino

STP Digital – O que nos sugere para hoje?

Chef Viviane Cursino – De entrada: Um creme de sapateira (santola) com Bôla de búzio do mar e “cêlo sum zon maiá”. Umas bolinhas de peixe com molho de limão, alho e maionese.

Peixe: Corvina em lascas com batata gratinada, gimboa salteada e broa crocante.

Carne: cabrito assado, com puré de matabala, legumes salteados e molho de alecrim.

Sobremesa: Pudim de côco com doce de abóbora, rabanadas bêbedas e   aranha esfarelada.

STP Digital – O sãotomense é por natureza “bom garfo”. Na sua opinião, falta público para mais restaurantes em São Tomé e Príncipe ou faltam mais restaurantes para o público?

Chef Viviane Cursino – Falta mais público para mais restaurantes.

Sobre o Autor

Redação

Diário Digital generalista, que prima pelo jornalismo exigente e de qualidade, orientado por critérios de rigor, isenção e criatividade editorial. Acreditamos que a existência de uma opinião pública informada, activa e interveniente é condição fundamental da democracia.

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